September 20, 2010

Blood Morning


foi então que ela percebeu que a manhã era a melhor parte do dia. de manhã, bem cedinho. Tirando o magistral momento de acordar, onde os pensamentos cortados na noite seguinte voltam à tona com força total, nos fazendo ficar meios zonzos com perguntas que ainda não podemos responder, é o melhor momento do dia. Suas indefinições cinzas, seus contornos estranhos, seus graus de subversão sonolentos. o desespero é mais leve, é só uma marca. não se espalha fácilmente, você pode aproveitar e o observar o sol lá fora, porque a esperança de que as coisas melhorem ainda pode ser ouvida, é permitido. são só oito horas da manhã. tudo é possível às oito horas da manhã. você pode tomar o seu café, e ele pode estar amargo, não tem problema. você pode pintar a cara pra ficar menos obvia, pode  pintar os olhos também, mas a noite eles estão pretos, lágrimas pretas escorridas na face. você pode ouvir uma música, e talvez ela te anime e te faça pensar que vai ser diferente. Você pode esboçar um sorriso. São nove da manhã. O sorriso está torto, amarelo. um leve peso passa a surgir no peito, aquela sensação que você já conhece. mas há um sorriso, ele está lá. ao lado do café amargo e agora gelado, largado de forma displicente em cima da mesa. o olhar. a espera. você não quer pensar nisso, nunca quer. esperar é a rendição dos jovens. você treme um pouco agora, é no mínimo natural. natural como as infiltrações na parede. as infiltrações na parede não são reais. você anda, roda, volta, senta. o peso cresce. você escreve. a música muda de tom. você percebeu? você só repete aquelas que te fazem lembrar como você é uma idiota estúpida, e está se tornando um pequeno zumbi. São dez horas. você pode falar algo, mas será apático e sem luz. você pode pegar um café novo em folha, mas o gosto de carvão continuará na boca. e ele ficará largado, tal qual o outro. você pode tentar fingir que não se importa e que tá no controle da situação, mas pra que mesmo? o comportamento fica mais e mais intrigante. você já não ouve mais, porque não é nada disso o que te importa. NADA. vagamente você faz um trejeito político, um aceno, um olá, uma pergunta que você não quer, definitivamente, saber a resposta. não é por maldade, é só um estado onde as coisas estão tão absurdamente doloridas, que não há fuga. São onze horas. a música soa como um tormento. você respira com dificuldade, porque a dor a essa altura já é física. você não escreve nada. o almoço não parece em nada uma boa ideia. vomitar sim seria uma. você tem o corpo mole, capenga, pro lado. estranho. sua cabeça não condiz com o resto do conjunto. a temperatura ambiente simplesmente não faz sentido, você sente um formigamento percorrendo o corpo todo. o desespero é uma ferida aberta, pulsante, vermelha. Tem gosto de sangue. e de repente, o ódio. aquele que a manhã estava banindo de todas as formas possíveis. e ele abunda o seu peito, é como uma droga. ele te alimenta, te dá expressão. e te faz explodir num choro inabalável de incertezas. ele te embala.
são doze horas.
você se importa, idiota. e é esse o seu erro.
bom dia.

2 comments:

Claris said...

que bom que saiu do rascunho. ;)

Claris said...

meu, to ha uns cinco minutos tentando ler. mas a redação tá cheia de adolescentes. deixa pro silêncio da minha casa na madrugada.